BRASÍLIA. O presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a cogitar da demissão do ministro da Saúde, José Serra, depois de tomar conhecimento da nota divulgada anteontem por ele. Fernando Henrique ficou irritadíssimo ao saber que a nota criticava o programa de cortes orçamentários da equipe econômica e afirmava que os recursos destinados à saúde teriam caído 12,4% de 1994 para cá em relação ao PIB. A nota dizia ainda que a CPMF não beneficiou o setor desde que começou a ser cobrada, em janeiro de 97. Acalmado por amigos ainda na noite de quarta-feira, Fernando Henrique cobrou ontem explicações do ministro, que recuou. Serra disse, em entrevista, que a nota não representava a posição do Ministério da Saúde. - Na minha opinião, não se justifica o alvoroço, pois a nota não é um manifesto do Ministério da Saúde. Toda essa onda de demissão é folclórica - disse. Segundo políticos aliados, Fernando Henrique se sentiu traído, pois havia jantado com Serra na véspera no Palácio da Alvorada e o ministro não fizera qualquer menção à nota. O presidente só tomou conhecimento quando os primeiros jornalistas começaram a ligar para o Planalto. O presidente ainda tentou, em meio às votações da reforma da Previdência que aconteciam na Câmara, localizar o ministro para pedir explicações, mas não conseguiu. Antes de deixar o Planalto, assessores o aconselharam a não tomar qualquer decisão de cabeça quente. Fernando Henrique só conseguiu falar com o Serra ontem na hora do almoço. A conversa foi bastante dura. Na entrevista, Serra minimizou a nota. Segundo ele, os números são verdadeiros, mas foram explorados por alguém da oposição no momento em que era votada a reforma da Previdência. Serra chamou de folclóricos os rumores sobre a possibilidade de ser destituído. Frisou ainda que os dados são meramente técnicos, sem conotação política, e que foram levantados para subsidiar as discussões do Conselho Nacional de Saúde, tendo em vista o novo orçamento da área social. Ele estranhou a reação, lembrando que os números estão disponíveis no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siaf). - Os parlamentares que falaram hoje (ontem) comigo não tinham lido a nota - comentou. Sobre a CPMF, o ministro disse não fazer objeção caso a contribuição não seja vinculada à saúde. Segundo ele, sua preocupação é com a fatia que seu ministério vai receber do orçamento. - Apoio a política que o presidente define com relação às receitas. A minha batalha é a fatia da saúde no Orçamento. Naturalmente, todos os ministérios estão preocupados com que não haja cortes em cada um deles. Durante todo o dia, Serra recebeu a solidariedade da oposição e críticas de aliados. O ministro da Educação, Paulo Renato Souza, reclamou com veemência dos métodos usados para se queixar dos cortes na área social. - Estou há quatro anos no ministério e nunca me ouviram reclamar de cortes em público. Tive de brigar muito pelo meu dinheiro nesses quatro anos, mas briguei na calada dos gabinetes. Paulo Renato também reclamou de não ter sido avisado por Serra da divulgação de estudos sobre os gastos da área social, o que considerou falta de gentileza, e contestou os dados da assessoria do Ministério da Saúde. - Não foi por falta de recursos que deixamos de fazer alguma coisa na educação. Sou ministro do Brasil em 98 e a crise é em 98. Temos de tratar de fazer o melhor possível dentro dos recursos disponíveis - disse Paulo Renato. O presidente do Senado, Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), depois de conversar com o presidente, disse que seu estilo era diferente do de Fernando Henrique. E deixou claro que, no lugar dele, teria substituído o ministro. Na sua opinião, as divergências internas não devem ser externadas nunca. O senador ressaltou que o momento é de sacrifício para todos, e não apenas para alguns. - Tenho uma tese de que quem quer criticar deve criticar internamente. Ministro é ministro. Há de se ter uma disciplina e, sobretudo, uma hierarquia. Acho que ministro não pode discutir em público divergências que tenha com a equipe econômica. Mas, se por acaso, ele ou qualquer outro estivesse prejudicando o Governo, remove-se. Em uma crise como esta pessoas são trocadas. O porta voz da Presidência, Sérgio Amaral, disse que o presidente se deu por satisfeito com os esclarecimentos do ministro. - O presidente considera que sua autoridade foi restabelecida depois do esclarecimento do ministro de que não teve a a intenção de promover um manifesto contra o ajuste fiscal - disse.
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